Brejo Redondo

Freguesia/Concelho:Sines (Sines)

Localização:37°56'20.39"N; 8°49'54.83"W (C.M.P. 1:25000, Folha 526)

Cronologia:Neolítico antigo evolucionado / Neolítico médio

O sítio arqueológico do Brejo Redondo, localizado em área plana e arenosa, confinante com a vertente litoral rochosa, tinha acesso franco à praia e era servido por nascentes de água doce, aflorantes na arriba. A ocupação neolítica assentou sobre areias móveis do Plistocénico que, em profundidade, adquirem textura arenítica e repousam sobre xistos do Carbónico marinho. Escavado em 2002 numa área de 204 m2, no decurso de intervenção de salvamento motivada por empreendimento público, sob a direcção de Carlos Tavares da Silva e Joaquina Soares (Museu de Arqueologia e Etnografia do Distrito de Setúbal), veio a revelar-se como um estabelecimento de curta duração, provavelmente dedicado à exploração de recursos marinhos, atribuível a fase avançada do Neolítico antigo ou aos alvores do Neolítico médio.

O nível arqueológico, bem definido por estruturas de combustão e pelo óptimo de densidade de artefactos e de termoclastos corresponde à base (cerca de 0,1m de espessura) de camada (C.2) de espessura compreendida entre 0,25m e 0,45m e constituída por areia solta, amarelada clara, com abundantes termoclastos e artefactos líticos e cerâmicos. Estes materiais não se distribuíam de modo uniforme, mas formavam concentrações que poderiam pertencer a unidades domésticas, por vezes polarizadas por estruturas de combustão. Foi possível determinar a área de um destes núcleos; de contorno aproximadamente ovalado (eixo maior de orientação N-S) possuía 8x6m. As estruturas de habitat identificadas são exclusivamente de combustão e reduzem-se apenas a duas. Porém, a elevada densidade de termoclastos que se verificou em alguns quadrados parece indicar a existência de outras estruturas de combustão, desmanteladas por dinâmicas erosivas, pós-deposicionais.

Estas estruturas eram constituídas por densa acumulação de termoclastos em que predominavam as rochas ígneas locais; alguns destes termoclastos conservavam ainda grande parte do córtex dos seixos rolados que, recolhidos na praia próxima, foram utilizados na construção de um aparelho pétreo que funcionou como acumulador térmico, de contorno sub-circular, com 0,5m de diâmetro máximo, preenchendo depressão com cerca de 0,10m de profundidade, aberta no topo da camada (C.3) de areias soltas e branco-amareladas do Plistocénico.

A indústria de pedra lascada concentra a maior parte dos testemunhos da cultura material móvel do sítio de Brejo Redondo. O carácter expedito ou imediatista da maioria dos seus artefactos dá-nos conta da prática in situ da actividade de talhe lítico, tendo como suporte matérias-primas recolhidas na praia contígua e modelos morfofuncionais pouco especializados, que se enraízam numa tradição milenar de macroutensilagem expedita e que sobreviverão a este período. Assim, estão presentes neste subsistema tecnológico duas cadeias operatórias que se iniciam no núcleo-teste ou pré-núcleo ensaiado a partir de seixo rolado e conduzem, através das técnicas de debitagem e do retoque, à elaboração de instrumentos sobre lasca, como raspadores, ou denticulados, ou à manufactura de instrumentos nucleares a partir do desbaste controlado da massa do próprio núcleo. O padrão morfométrico dos produtos debitados é constituído pela lasca curta, de espessura média. Ausentes os produtos longos.

O subsistema tecnológico uso intensivo é claramente minoritário; o sílex é suplantado pelo quartzo leitoso com evidente perca de eficiência. As formações mesozóicas de Santiago do Cacém teriam constituído a fonte de aprovisionamento do sílex. Os artefactos são pouco especializados, registando-se a presença de somente duas peças longas, apontando uma delas (lâmina com retoque simples, marginal e parcial) para um momento tardio dentro do Neolítico antigo, ou seja, para o Neolítico antigo evolucionado ou mesmo para o Neolítico médio.

A indústria em pedra polida/bujardada apresenta um elevado índice de fragmentação, grau de exaustão próprio de uma sobre-utilização dos instrumentos, alguns deles manufacturados sobre rochas anfibolíticas, não locais.

A importância do fogo no ambiente doméstico é confirmada pelas suas marcas sobre diversos artefactos de sílex.

Embora o número das peças em sílex seja reduzido (23 exemplares) e as generalizações a partir desta amostra, frágeis, constatou-se uma clara polarização da sua distribuição em torno da Estr. P11, facto que permite supor alguma especialização funcional no que concerne às estruturas de combustão.

A cerâmica é escassa em relação à totalidade dos utensílios líticos exumados (somente 0,1%,NMl=7) e ocorre em formas ovóides ou esferoidais, ligeiramente fechadas e de bordo simples, e em taças em calote; a cozedura processou-se em ambiente redutor com fase final oxidante; só 2 exemplares apresentam decoração: impressa (fiadas horizontais de impressões em crescente) e incisa (sulco largo e horizontal imediatamente abaixo do bordo). Um exemplar oferece pequena asa vertical encimada por ténue saliência mamilar, que arranca do lábio do recipiente.

A fraca densidade dos materiais arqueológicos, associada ao domínio do subsistema tecnológico expedito do talhe em pedra lascada, sugere a existência no local de um estabelecimento de curta duração, cuja vocação pode ter sido a exploração dos recursos marinhos, objectivo legível não só no padrão locativo do habitat, mas também no caminho do mar claramente indicado pelas matérias-primas. A não conservação de matéria orgânica impede-nos de confirmar tal hipótese através de testemunhos directos.

A indústria lítica em sílex, embora escassa, sugere uma cronologia do Neolítico antigo evolucionado ou dos alvores do Neolítico médio. A cerâmica aponta no mesmo sentido.

Bibliografia:

TAVARES DA SILVA, C. & SOARES, J. (2004) – Intervenção arqueológica no sítio neolítico de Brejo Redondo (Sines). Musa: museus, arqueologia e outros patrimónios, 1, p. 83-110.

TAVARES DA SILVA, C.; SOARES, J. & COELHO-SOARES, A. (2010) – Arqueologia de Chãos de Sines. Novos elementos sobre o povoamento pré-histórico. Actas do 2º Encontro de História do Alentejo Litoral, p. 11-34.

Carlos Tavares da Silva

Joaquina Soares

Antónia Coelho-Soares

 

Fig. 1 - Brejo Redondo, 2002. Localização da área escavada.

Fig. 2 - Brejo Redondo, 2002. Aspecto da escavação.

Fig. 3 - Brejo Redondo, 2002. Distribuição espacial dos termoclastos.

Fig. 4 - Brejo Redondo, 2002. Estrutura de combustão.

Fig. 5 - Brejo Redondo, 2002. Sondagem XIII. Plano com estruturas, termoclastos e artefactos exumados na base da Camada 2. De notar a identificação de três núcleos habitacionais revelados a partir das concentrações mais densas de materiais arqueológicos.

Fig. 6 - Brejo Redondo, 2002. Distribuição espacial da indústria lítica.

Fig. 7 - Brejo Redondo, 2002. Indústria lítica.

Fig. 8 - Brejo Redondo, 2002. Distribuição espacial dos artefactos cerâmicos.

Fig. 9 - Brejo Redondo, 2002. Cerâmica.