Igreja de Santa Maria do Castelo/Igreja Matriz de Alcácer do Sal

António Rafael Carvalho

 

Freguesia/Concelho: União das Freguesias de Alcácer do Sal e de Santa Susana.

Localização: 38°22'21.03"N; 8°30'45.91"W. Interior do recinto do Castelo. Alcácer do Sal. (CMP.1:25.000, Folha 476). A Matriz de Alcácer do Sal localiza-se no espaço intramuralhas do recinto do castelo, numa das zonas monumentais de maior antiguidade da cidade. É sem duvida um dos mais eloquente testemunho de como se foram sucedendo as épocas construtivas num mesmo espaço, escolhendo os novos poderes os locais simbólicos mais relevantes do tempo político e civilizacional anterior, para melhor impor a sua autoridade.

Classificação: Classificado como IIP - Imóvel de Interesse Público, pelo Decreto n.º 38 147, DG, I Série, n.º 4, de 5-01-1951.

Cronologia:Século XIII, com preexistências anteriores que remontam até ao Período Romano, passando pelo Período Islâmico.

Descrição: A Igreja de três naves e capela-mor apresenta a sacristia, casa paroquial, capela e torre sineira, adossadas ao lado sul, e três capelas no lado norte.

Se a estrutura geral da obra é ainda românica, muitos foram os melhoramentos por que o templo passou nos séculos seguintes. Na época moderna, pelos séculos XVII-XVIII, refez-se a cobertura, suprimindo-se o tecto original, presumivelmente de madeira, para a actual solução de três panos. A frontaria foi bastante transformada nessa altura, com novo segundo andar e coroamento (que incluiu uma janela monumental) e, principalmente, com torre sineira barroca, de secção quadrangular e adossada à face lateral Sul da frontaria. No interior, construiu-se a Capela do Santíssimo Sacramento (2ª metade do século XVII), que tem a particularidade das paredes laterais serem revestidas por azulejos policromos seiscentistas.

A capela-mor, a capela do Santíssimo e a capela fronteira datam de uma campanha de obras no século XVIII, a cargo de Bartolomeu de Oliveira e José Gomes da Silva.

Resenha histórica: Vários têm sido os investigadores que sugerem ter existido, na área da igreja, a mesquita da madīna Islâmica de Qaṣr al-Fatḥ (Carvalho et al., 2004; Carvalho & Wu, 2014 e Pereira, 2007, p. 69). De fato é perceptível nos nossos dias um conjunto de elementos reutilizados, que pertencem a fases anteriores à presença portuguesa após a conquista, nomeadamente a existência de colunas romanas usadas na alvenaria de algumas paredes.

Escavações recentes sugerem que a primitiva construção implantada neste espaço tenha sido um templo romano, posteriormente cristianizado (Carvalho, Faria & Ferreira, 2004, p. 27). Desconhece-se ainda como se terá processado esta transição, bem como a cronologia em que o cristianismo triunfou na antiga Salacia Imperatoria Urbs. Num anexo norte do edifício foram incorporadas duas colunas romanas, como cunhais de obra nova, o que pressupõe ter a primitiva basílica sido construída ainda com os edifícios romanos de pé.

A Alta Idade Média continua a ser pouco mais que muda em termos arqueológicos. No Museu Municipal Pedro Nunes conservam-se dois capitéis que têm sido catalogados de época visigótica (Barroca, 1992, p. 92), mas outras opiniões apontam para cronologias mais tardias, eventualmente já moçárabes (Real, 1995), ou na órbita islâmica califal (Almeida, 1986, p. 52 e 81). A terem sido resgatados na igreja do castelo, esses capitéis são peças fundamentais para a caracterização do espaço em algum momento da Alta Idade Média, condicionando a sua atribuição cronológica.

Outra sugestão ainda não confirmada arqueologicamente: a de que sobre a basílica paleocristã se implantou a mesquita-maior, como pensa Pereira, 2007, p. 69.

O edifício que hoje conhecemos foi construído a partir da conquista da cidade pelas tropas portuguesas de 1217. Ele é, por isso, e pela descaracterização generalizada do paço medieval, o mais importante testemunho da vitória cristã e do novo tempo civilizacional, que fez com que Alcácer ficasse na posse da Ordem de Santiago. Trata-se de um dos mais meridionais edifícios tardo-românicos, que integra já alguns elementos de transição, em particular ao nível da flora dos capitéis do corpo.

Bibliografia

BARROCA, M. J. (1992) – Comentário das peças 1, 2 e 3 do Núcleo I. Nos Confins da Idade Média. Catálogo da Europália. Porto: Instituto de Museus.

CARDOSO, L. (1747) – Diccionario geográfico ou Noticia Historica de todas as Cidades, Villas, Lugares, e Aldeias, Rios, Ribeiros, e Serras dos Reynos de Portugal, e Algarve, T. 1. Lisboa: Na Regia Officina Sylviana e da Academia Real.

CARVALHO, A. R.; FARIA, J. C. & FERREIRA, M. A. (2004) – Alcácer do Sal Islâmica: Arqueologia e História de uma Medina do Ġarb al-Andalus (séculos VIII-XIII). Ed. Câmara Municipal de Alcácer do Sal e IPM.

CARVALHO, A. R.; FARIA, J. C. & FERREIRA, M. A. (2008) – (Al Qaṣr) Alcácer do Sal Islâmica: Arqueologia e História de uma Medina do Ġarb al-Andalus (séculos VIII-XIII). Ed. Câmara Municipal de Alcácer do Sal.

FREYTAS, L. Perdigão de (1758) - Freguesia de Santiago, Alcácer do Sal. In Memorias Paroquiais, 71, p. 501-506. (consultado em 17-06-2014, http://digitarq.dgarq.gov.pt/details?id=4240852). Seguimos a leitura paleográfica efectuada por Carla Macedo.

PEREIRA, M. T. L. (2000) – Alcácer do Sal na Idade Média. Ed. Colibri e Câmara Municipal de Alcácer do Sal.


Fig. 1 Localização da Igreja Matriz de Alcácer do Sal em extracto de C.M.P na esc. 1:25 000.

Fig. 2 – Porta em estilo românico tardio que no século XIII serviu de entrada principal da igreja de Santa Maria. Foto Rosa Nunes.

Fig. 3 – Pormenor da decoração da fachada da igreja do século XIII. Fotos de Rosa Nunes.

Fig. 4 – Interior do corpo da igreja matriz de Alcácer do Sal. Foto Rosa Nunes.

Fig. 5A – Capiteis românicos tardios do interior da Igreja Matriz de Alcácer do Sal. Fotos de Rosa Nunes.

Fig. 5B – Capiteis românicos tardios do interior da Igreja Matriz de Alcácer do Sal. Fotos de Rosa Nunes.

Fig. 5C – Capiteis românicos tardios do interior da Igreja Matriz de Alcácer do Sal. Fotos de Rosa Nunes.

Fig. 5D – Capiteis românicos tardios do interior da Igreja Matriz de Alcácer do Sal. Fotos de Rosa Nunes.

Fig. 6 – Frontal de altar em azulejos de padrão do século XVII. Foto de Rosa Nunes.

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