Metodologia

A elaboração do ATLAS teve uma componente de trabalho de campo em que foram efetuadas amostragens para identificação e contabilização de espécies, uma componente de tratamento de dados que implicou a revisão das espécies amostradas e uma componente de redação, que implicou a consulta de documentação técnico-científica para efetuar a caracterização e preparação de um documento que tem como alvo o público geral.

Amostragem de dados

Os protocolos de amostragem aplicados variaram consoante as comunidades amostradas. A caracterização dos sistemas ecológicos marinhos e habitats presentes na faixa costeira entre a Comporta e o Burgau seguiu duas abordagens distintas: uma direcionada para as comunidades presentes no intertidal (a faixa costeira entre o limite mínimo da baixa-mar e o limite máximo da preia-mar) e outra para caracterização das comunidades presentes no circatidal (a faixa costeira que fica permanentemente imersa).

A distribuição dos locais de amostragem teve por referência 8 áreas principais entre a faixa compreendida pelo limite superior de influência da maré e a isobatimétrica dos -30m. Apesar de o esforço de amostragem se ter concentrado nas 8 áreas acima referidas, em algumas áreas, a dificuldade de acesso pela costa impôs a realização de pontos de amostragem fora dos seus limites. No troço de costa entre Sagres e o Burgau foram efetuados pontos fora da área 8 (Figura 1) como forma de aumentar a cobertura da amostragem dentro dos limites da área de estudo.

Intertidal

A amostragem no intertidal foi realizada entre a Comporta e o Burgau, tendo-se efetuado um total de 48 pontos de amostragem de espécies da zona intertidal. Na linha de costa entre a Comporta e Sines, para além da amostragem, foi feita uma prospeção em busca de plataformas de natureza rochosa em 7 pontos (Figura 1).

Em cada local prospetado a amostragem teve por base o método dos quadrados. A área de cada quadrado de amostragem foi de 50x50cm. Os quadrados foram dispersos ao longo de um transecto entre o limite do nível do mar durante a baixa-mar e o limite superiordo supratidal de forma a amostrar as biocenoses que tipicamente formam bandas paralelas ao limite do nível do mar em função da tolerância à dessecação, temperatura e luz solar das diferentes espécies.

Em cada quadrado foram amostradas as espécies dos diferentes grupos faunísticos e de macroalgas presentes, e foi estimada a sua percentagem de cobertura em relação à área do quadrado. De forma a aumentar a representatividade da amostragem, foi feito um número mínimo de 4 quadrados no infra-litoral, 6 no médio-litoral e 2 no supra-litoral.

Em cada local em que o substrato era rochoso foram amostrados os enclaves com melhores características para a ocorrência de maior diversidade de espécies.

Foram também efetuados percursos pedestres em cada nível do intertidal para completar os inventários de espéciesno que diz respeito aos organismos mais raros ou para aqueles que apresentam uma distribuição em mosaico e não uma distribuição uniforme.

As amostragens efetuadas em substrato móvel foram realizadas recorrendo à recolha e triagem de substrato para identificação de espécies de macrofauna presentes. A recolha de substrato foi realizada utilizando um Tubo de Amostragem de Substrato Móvel (TASM).

De forma a aumentar o sucesso das prospeções, sempre que possível a amostragem foi replicada durante o período noturno e foram recolhidas amostras adicionais para confirmação posterior.

De forma a evitar a degradação das amostras, a triagem, identificação e contabilização das espécies recolhidas no intertidal foi efetuada no campo utilizando crivos, duas lupas estereoscópicas, pinças de pontas finas, agulhas e chaves de identificação.

 

Figura 1 – Localização dos pontos de amostragem para a caracterização do intertidal.

Circatidal

Com o objetivo de inventariar principais espécies de peixes, invertebrados e algas e conhecer os principais biótopos e habitats presentes no leito marinho, na zona circatidal foram efetuadas prospeções recorrendo a mergulho com escafandro autónomo (40 pontos) e em apneia (26 pontos) num total de 66 pontos.

Devido a constrangimentos relacionados com a ausência de acessos a partir de terra e com as limitações legais impostas para as embarcações de classe 4, a amostragem realizada com apoio de uma embarcação foi limitada a 34 pontos. Nos restantes 32 locais amostrados o acesso foi feito a partir de terra. Na maioria dos locais acedidos a partir de terra, por uma questão de segurança, a amostragem foi feita em apneia. Nos restantes pontos o estado do mar na altura em que a amostragem foi realizada permitiu a utilização de escafandro autónomo (Figura 2).

De forma a garantir uma amostragem diversa em termos de riqueza específica, a seleção dos locais de amostragem privilegiou zonas com recifes rochosos ou artificiais e zonas arenosas de transição. Foi ainda realizada uma imersão no naufrágio Torvore, na costa Algarvia, por ser um recife artificial existente há mais de 30 anos sobre substrato arenoso cujas biocenoses presentes correspondem a estados climácicos.

Na faixa costeira entre a Comporta e Sines foram efetuadas prospeções em 7 locais, com o intuito de se identificarem maciços rochosos. Dado não se terem localizado recifes rochosos de grande dimensão, nestes locais apenas foram efetuados percursos a partir da superfície em apneia.

Nos pontos de amostragem do circatidal foram efetuados censos de espécies recorrendo a quatro metodologias principais: a amostragem de algas e invertebrados sésseis pelo método dos quadrados; a realização de transectos de 50m de comprimento de amostragem de espécies não-sésseis ou de macro-organismos sésseis com uma distribuição não-uniforme; a amostragem pontual de espécies criptobentónicas deslocando pedras presentes no leito; a amostragem de substrato móvel removendo cerca de 10cm de profundidade numa área de 30x30cm.

A amostragem com recurso ao método dos quadrados consistiu na realização de inventários de espécies sésseis e invertebrados bentónicos em áreas de 50x50cm divididas em quadrados de 10x10cm. A percentagem de cobertura aproximada de cada espécie foi estimada em relação á área total de cada quadrado e na sua envolvente de forma a reduzir enviesamentos associados às áreas amostradas. De forma a aumentar a eficiência da amostragem foram feitos registos fotográficos nas superfícies amostradas e recolhidos indivíduos para confirmação no barco de apoio durante o intervalo de superfície. Em cada ponto foram efetuados 4 quadrados de amostragem.

Os transectos de amostragem foram realizados nos dois sentidos de forma a concentrar a amostragem das espécies pelágicas e demersais num dos sentidos, e a amostragem das espécies criptobentónicas e sésseis no sentido oposto. De forma a garantir que a distância percorrida nos transectos não variou significativamente foi utilizada uma bobine com 50m de fio de nylon pré-esticado, ou de fio de kevlar. Durante os transectos foram identificadas as espécies e contabilizados os indivíduos. Sempre que possível foram realizados registos fotográficos.

A amostragem das espécies criptobentónicas consistiu na análise detalhada de pequenas cavidades e fissuras presentes nas rochas para identificação de espécies de peixes e invertebrados não-sésseis que permanecem nestes abrigos.

A amostragem de substrato móvel no circatidal foi realizada através da remoção de uma camada de cerca de 10cm de profundidade numa área de 30x30cm. O sedimento foi removido utilizando pás de pequena dimensão e colocado num saco de rede com malha de 0,5mm. O saco de rede foi emerso a partir da superfície e as amostras foram limpas, triadas e os indivíduos identificados e quantificados a bordo com recurso a lupas, pinças, agulhas e chaves de identificação.

A amostragem efetuada em apneia implicou a adaptação dos protocolos de amostragem às características da amostragem. Assim, de forma a garantir a uniformidade do esforço de amostragem manteve-se o mesmo número de quadrados de amostragem por cada local o percurso do transecto foi marcado antes do trabalho de prospeção, utilizando duas boias de superfície com duas poitas de 500g, unidas entre si por um cabo com 50m de comprimento.

Por limitação da própria metodologia e das condições locais a amostragem em apneia foi efetuada a uma profundidade inferior a 10m. As triagens e confirmação das espécies recolhidas durante as amostragens foram efetuadas imediatamente após a prospeção para evitar a degradação das amostras.

Nos pontos prospetados, a amostragem foi ainda complementada com uma amostragem adicional de indivíduos de espécies que foram identificadas fora dos quadrados e dos transectos realizados.

Durante as amostragens do circatidal foram também recolhidos elementos sobre o tipo de habitats e biótopos presentes em cada local amostrado, que foram utilizados na caracterização dos mesmos.

Figura 2 – Localização dos locais de amostragem de fauna e flora circatidal.