Cerro do Castelo do Viradouro

Freguesia/Concelho: Sabóia (Odemira)

Localização: 37°28'54,0"N; 8°29'10,0"W (C.M.P. 1:25.000, Folha 570)

Cronologia: Período Romano, Idade do Ferro (?)

O Cerro do Castelo é um sítio romano de época tardia, ocupado durante o Baixo Império. Localiza-se no lugar do Viradouro, na freguesia de Sabóia, aldeia de que dista menos de dois quilómetros, para nascente. O sítio ocupa uma posição estratégica, num cabeço isolado e de topo amesetado que, como uma ilha, se soergue mais de trinta metros a meio do largo e extenso vale da ribeira de Telhares. Esta ribeira ladeia o antigo povoado romano na parte terminal do seu curso, a menos de dois quilómetros da sua confluência com o Mira, a norte.

O Cerro do Castelo foi sentinela da importante via de comunicação norte-sul que o extenso e largo vale da ribeira propícia nesta área. No corredor em que o castelo ocupa posição central e destacada, passam a linha férrea do sul (da década de 1880) logo a nascente, e a estrada regional 266 (das primeiras décadas do século XX) construída sobre um caminho antigo, logo a poente do castelo. Esse velho caminho deve ser, neste troço, a uiam de Saboya apontada no foral de 1256 como limite do termo de Odemira para sul de Garvão (Ourique), numa linha que prosseguia, como a R266, para Benafátima (Monchique), a sul. Sabóia é uma aldeia de fundação em Época Moderna (c. 1572), mas o nome, que designava toda a área, é bem mais antigo e pode ter origem num hidrónimo pré-romano com radical sab-, presente, por exemplo, no rio Sabor ou na Saboya que na Idade Média existia junto ao Tejo ribatejano.

O Castelo do Viradouro, que deu nome às herdades do Castelo e Quinta Nova do Castelo, foi identificado apenas em 1995, depois de primeiras referências publicadas, em 1946, acerca da existência, aliás dada em local errado, de um suposto castro pré-histórico na área. O sítio é também conhecido por Cerro da Palhota ou Cerro do Ouro.

Relatos de antigas escavações, feitas em meados do século XX por pesquisadores do tal tesouro que, segundo o nome, o cerro prometia guardar, descrevem a descoberta, a dois metros de profundidade, de coisas bem mais triviais, sem fortuna escondida pelos mouros: muros de pedra e barro e pavimentos lajeados, bilhas de loiça.

Nunca se realizaram estudos arqueológicos de pormenor sobre este sítio. Actualmente, reconhece-se a presença de um grande talude que coroa, pelo menos a metade sul do cerro. Este talude foi originado por uma muralha defensiva que delimitava a área do antigo povoado. Pela microtopografia do cume, é provável que a área do cume fosse dividida em duas por uma muralha interna, com alinhamento nascente-poente. No flanco poente do cabeço, os vestígios dessa muralha são mais ténues, mas parece ter existido também um fosso defensivo. O curso da ribeira de Telhares faz um peculiar meandro na área, indo embater, de sul, na base da elevação do povoado, que em seguida contorna por poente, pelo que poderia ela própria constituir um fosso natural de delimitação do povoado. No lado nascente do povoado, onde não existe nenhuma linha de água, a muralha seria consideravelmente mais robusta.

A ausência generalizada de materiais arqueológicos ou construtivos na superfície do terreno significa que as estruturas arqueológicas do povoado romano estão bem conservadas no subsolo, soterradas sob uma profunda estratigrafia originada pelo aluimento das construções antigas que, como normal na região, deveriam ser de pedra e terra. O mesmo é indicado pelos relatos dos antigos pesquisadores, que diz-se terem encontrado paredes e calçadas a dois metros de profundidade.

O tipo de implantação e as estruturas defensivas do Cerro do Castelo do Viradouro são característicos dos povoados fortificados ribeirinhos da II Idade do Ferro do Sudoeste Peninsular. O Cerro do Castelo pode, assim, corresponder a um povoado pré-romano, mas nunca se encontraram no local artefactos indiscutivelmente datados da Idade do Ferro. O únicos objectos cuja cronologia é mais clara, nomeadamente fragmentos de grandes dollia (talhas), de ânforas e de cerâmica fina importada de tipo terra sigillata clara, apontam para uma ocupação, ou reocupação, do sítio durante o baixo Império ou na Antiguidade tardia (séc. IV-V d.C.).

Os contornos e propósitos dessa reocupação são desconhecidos. É possível que o estabelecimento num lugar fortificado seja reflexo da insegurança que se verificou com a queda do Império romano, ou com o intento de, no mesmo contexto, controlar a via de Sabóia, ligação entre o Algarve e o Alentejo pelo passo de Monchique. Mas a presença de taças de cerâmica de aparato (terra sigillata clara) importadas da bacia do Mediterrâneo aponta para que, à imagem do verificado noutros sítios tardo-romanos da Lusitânia, os circuitos comerciais se mantiveram e que os residentes do Cerro do Castelo tinham capacidade de aquisição de bens dispendiosos.

Bibliografia:

QUARESMA, A. (2011) – Sabóia: um topónimo misterioso. FO Magazine, 3, (Julho-Agosto 2011). Odemira, p. 32.

VILHENA, J. (2006) – O sentido da permanência: as envolventes do Castro da Cola nos 2.º e 1.º milénios a.C. Tese de Mestrado orientada pelo Prof. Dr. Carlos Fabião, 2 vol. Lisboa: Universidade de Lisboa. 153+52 pp.

VILHENA, J. (2014) – Acupunctura em Odemira: dois séculos de Arqueologia. In P. PRISTA (coord.), Ignorância e Esquecimento em Odemira. Odemira: Município de Odemira.

Jorge Vilhena

 

Fig. 1 – Cerro do Castelo, Viradouro, visto de nordeste. Ao fundo, a serra de Monchique.

Fig. 2 – Topo setentrional do Cerro do Castelo, ao centro do vale da ribeira de Telhares (Sabóia).

Fig. 3 – Cerro do Castelo do Viradouro, visto de sul.

Fig. 4 – Cerro do Castelo, Viradouro, Sabóia. Flanco oriental do antigo povoado romano, onde é nítido o talude artificial no cume que esconde a muralha que coroa o cerro.

Fig. 5 – Domínio visual para sul do topo do Cerro do Castelo (Viradouro, Sabóia), na zona da muralha oriental.