Mina dos Pendões

Freguesia/Concelho: S. Luís (Odemira)

Localização: 37°38'32,79"N; 8°37'51,55"W (C.M.P. 1:25.000, Folha 553)

Cronologia: Período medieval

A mina de ferro da Herdade dos Pendões situa-se no vale de um ribeiro tributário da Ribeira do Torgal, onde apenas se pode chegar pelo caminho de 1,5 km de terra batida (com algumas zonas de trânsito menos fácil), que sai para o Monte de Sol Posto ao km 97,3 da E.N. 120, aprox. 150 m a N. da ponte de Sol Posto sobre a majestosa ribeira do Torgal.

Vale bem a pena o esforço de percorrer o caminho para chegar a esta antiga paisagem mineira: após passar pelo monte, percorre-se o caminho em ziguezague pela cumeada sempre na direcção nordeste e norte, desce-se para noroeste uma rampa recta e pouco inclinada por onde se chega ao fundo do vale de um pequeno regato, e toma-se o caminho da esquerda, em direcção à ponte e, depois de passar pelas ruínas da antiga Casa da Mina completamente envolta em silvado, está-se na área da mina.

Daqui para a frente, é necessário tomar cuidados redobrados: existem trincheiras altas de boca de mina, cujos rebordos são escorregadios e instáveis, e profundos poços de mina ocultos entre os arbustos, com dezenas de metros de queda na vertical, e outros que podem não estar descobertos entre a vegetação. Por cautela não se deve sair dos trilhos existentes. Os poços estiveram sinalizados e vedados em tempos por pilares com arame, mas o seu estado actual não confere segurança. Por último, não se deve entrar nas galerias das minas, mesmo as que parecem de mais fácil acesso. Estas cavidades são instáveis e a qualquer momento podem suceder desprendimentos de grandes pedras ou até abatimentos do tecto das galerias. Outra razão para não entrar nas galerias são colónias de morcegos existentes no seu interior, que não devem ser perturbadas.

A jazida dos Pendões compõe-se de dois filões com 400 m de óxidos de ferro (hematite e limonite) e manganês (pirolusite), encaixados em filões de quartzo; existem também impregnações dos mesmos minerais metálicos nos xistos de base. Estes foram o minérios metálicos explorados desde no final do século XIX. Existe ainda minério de cobre, mas não em quantidade que justificasse a sua exploração na época industrial.

A exploração industrial da mina de Pendões iniciou-se em 1866, quando foi registada como mina de cobre. A lavra foi depois suspensa em 1886 e retomada de 1900 a 1906. Existem dois tipos de cavidades mineiras dessa altura: galerias mais ou menos horizontais amplas, de dimensão regular, que perfuram a base da encosta a direito em direcção ao desejado filão de mineral metálico, e poços rectangulares com dois ou três metros de lado que, de cima dos cumes, descem na vertical até à mesma cota, com o mesmo objectivo.

Na vertente 150 m a poente da ruína da Casa da Mina, encontra-se um enorme depósito de grandes quantidades de gangas rejeitadas da laboração da mina em diversos períodos: é a escombreira, com milhares de toneladas de rochas extraídas do fundo. A sua acidez inibe o crescimento das plantas, numa típica paisagem mineira abandonada, quase desnuda de vegetação.

Uma das modernas galerias horizontais do século XIX acabou por seccionar uma galeria de mina diferente, de tipologia pré-industrial e bastante mais antiga. Trata-se de uma cavidade oblíqua, estreita e tortuosa, que desce em «saca-rolhas» quase na vertical seguindo o do filão, desde a superfície até duas ou três dezenas de metros de profundidade no subsolo. Este é a técnica de abertura de galerias subterrâneas de mineração comum desde o final da Pré-história até à Idade do Ferro, retomada na Idade Média, sendo divergente do tipos de galerias mais regulares e extensas deixadas na região pela actividade mineira do período romano. Esta primeira galeria medieval ou pré-romana é visível na parte interior de uma das trincheiras modernas que se desenvolve na direcção poente, um pouco a noroeste da ruína do monte dos Pendões.

Mais acima, ao longo da crista de quartzo que se desenvolve na encosta que sobe para poente, são visíveis uma segunda e uma terceira galerias de mina de tipologia pré-moderna, cujas aberturas têm arcos de rocha suspenso sobre as bocas redondas do estreitos e sinuosos poço. Estes arcos serviria para amarração de cordame para extracção do minério arrancado ao ventre da rocha.

A consciência da existência de antigas minas no local dos Pendões induziu aos outros nomes dado ao local: Cerro de Furnas ou Cerro dos Algares (do árabe al-gār, “caverna”, “cova” ).

Em 1872 era referida num relatório mineiro a presença de «grandes trabalhos antigos» de mineração «romana», desobstruídos na altura, e em 1957 assinalava-se que «abundam escórias possivelmente originárias de pequenas fundições também romanas».

Em verdade, a apreciação repetida de que os trabalho antigos remontavam a época romana, não sendo impossível, não está, no entanto, confirmada e era comum à época dos relatos dos engenheiros responsáveis pela estudo e laboração das minas, quando se considerava que toda a mineração antiga seria de tal período.

Os vestígios de redução de minérios no local estão associados a fragmentos cerâmicos de época medieval, com toda a probabilidade do período islâmico. A mesma cronologia é sugerida pela dispersão da ferraria, com múltiplos pontos de redução de ferro em fornalhas muito simples dispersos por todo o vale do ribeiro, desde a cumeada a noroeste até à foz, a leste do monte dos Pendões, do referido regato num ribeiro que desce de norte para a ribeira do Torgal, a sul. Estes vestígios de redução de minério são assinalados pela presença de fragmentos de escórias negras, normalmente de pequena dimensão (< 15 cm). Pelo contrário, os trabalhos de fusão de minérios de ferro de período romano tendiam a ser mais concentrados, de maior escala e em grandes fornalhas, produzindo como detritos muito volume de escórias e grandes placas deste material.

As escórias de ferro, como as que se encontram nos Pendões, são distintamente pretas e muito densas. Na região, estas escórias são conhecidas como jorra. Resultam da operação de redução de minérios de ferro a massas de ferro bruto em pequenas fornalhas de tipo baixo-forno, normalmente simples covas abertas no chão, preenchidas com uma mistura de carvão e minério triturado e cobertas por terra. Quando era atingida a temperatura de combustão necessária para o ponto de fusão no interior da fornalha (c. 1200 ºC), por meios de insuflação de ar com foles, o ferro agregava-se numa massa esponjosa que permanecia no interior do forno, posteriormente destruído para a sua recolha, enquanto que a escória, que é a parte do minério sem conteúdo metálico, era vazada para o exterior do forno ainda em estado de fusão através de uma abertura feita raso ao solo, onde a escória fluía liquefeita até arrefecer e solidificar sobre o chão do exterior da fornalha. Estas placas de escória preta ficavam então com superfícies irregulares: a inferior com o negativo da superfície de terra por onde escorreu, e a superior com um denso ondulado lustroso, de tipo lava. Esta tecnologia de baixo-forno com vazamento de escórias começou no final da Idade do Ferro, mantendo-se quase inalterada durante os períodos romano e medieval.

Normalmente, a operação de redução era feita perto das minas e onde havia provisão de muita lenha, necessária para a operação das fornalhas. Posteriormente, os trabalhos de refinação e modelação de ferro eram realizados noutros locais, em forjas junto de povoados.

Bibliografia:

GOMES , A. R. (1957) - Jazigos ferro-manganíseferos de Cercal-Odemira,3 vols. Lisboa: Direcção-Geral de Minas, Serviço de Fomento Mineiro.

VILHENA, J. & GRANGÉ, M. (2011) – Of Slags and Men. Iron mining and metallurgy in the Mira valley (Southwest Portugal) from Iron Age to the Middle Ages. InC. B. MARTINS, A. BETTENCOURT, J. I. MARTINS & J. CARVALHO (cords.), Povoamento e exploração dos recursos mineiros na Europa Atlântica Ocidental. Braga: CITCEM – Centro de Investigação Transdisciplinar Cultura, Espaço e Memória / APEQ – Associação Portuguesa para o Estudo do Quaternário, p. 83-111.

Jorge Vilhena

 

 Fig. 1 – Aspecto geral da área da mina de Pendões, vista de leste.

Fig. 2 – Aspecto geral da área da mina de Pendões, vista de poente.

Fig. 3 – Boca de galeria de mina do final do séc. XIX da mina dos Pendões.

Fig. 4 – Escombreira da mina de Pendões.

 

Fig. 5 – Mina de Pendões. Trincheira e boca de galeria de mina moderna do séc. XIX que interceptou poço mineiro mais antigo.

Fig. 6 – Mina de Pendões. Entrada de galeria subterrânea de tipologia pré-industrial.

Fig. 7 – Mina de Pendões. Boca dupla de galeria subterrânea de tipologia pré-industrial, com arco de pedra sobre o poço sinuoso sub-vertical.

Fig. 8 – Exemplos de escórias de redução de ferro em fornos de período medieval.