Troço entre Sagres e o Burgau

Ambiente Geomorfológico

O troço de costa entre Sagres e o Burgau tem orientação Oeste-Este e integra-se no extremo Oeste do corredor de ligação entre o Mar Mediterrâneo e o Oceano Atlântico. Neste troço, a natureza do substrato presente no limite de costa é arenoso formando arribas de arenito é interrompido por praias e pequenas linhas de água. A natureza pouco consolidada das arribas presentes no troço entre Sagres e o Burgau mantém-se por toda a costa algarvia e manifesta quatro forças que atuaram em conjunto na sua génese:

  • As regressões sucessivas do nível do mar durante o Pleistocénico;
  • A erosão por influência da ondulação e alterações químicas das rochas;
  • O transporte de sedimento pelos ventos dominantes;
  • A carga de inertes transportada pelas linhas de água presentes e a deriva costeira.

O abaixamento o nível do mar associado às glaciações no Pleistocénico (período que se estende a partir do início do Quaternário e início do final da última glaciação) expôs uma grande parte da área da Península Ibérica que se encontrava submersa e possuía diversas bacias de sedimentação natural. Com o abaixamento do nível do mar, a erosão relacionada com a rebentação das ondas e alteração química das arribas iniciou um processo de moldagem da linha de costa, que variou em função das oscilações do nível do mar.

Os ventos dominantes de Norte, que transportam sedimento proveniente do interior do continente, em conjunto com linhas de água que desaguam neste troço de costa introduzindo uma elevada carga de inertes, têm um papel preponderante na determinação do tipo de rocha e leito marinho presente no troço de costa em análise e antagonizam a erosão associada à ação do mar.

A natureza predominantemente arenosa presente no troço de costa entre Sagres e o Burgau prolonga-se pelo leito marinho. Neste troço, as áreas rochosas tornam-se menos frequentes e a uma profundidade geralmente inferior às áreas rochosas presentes no troço entre o cabo Sardão e Sagres descrito acima. Na proximidade das arribas surgem derrocadas, peões, grandes blocos e lajões submersos e, em locais mais afastados da costa, a natureza do leito é arenosa.

Biótopos intertidais

A natureza do substrato presente é o principal fator estruturante dos ecossistemas intertidais. No troço entre Sagres e o Burgau surgem quatro tipos geomorfológicos, que são:

  • Grandes áreas arenosas;
  • Arribas de natureza sedimentar;
  • Derrocadas junto às arribas;
  • Recifes rochosos.

As áreas arenosas formam grandes planícies no troço entre Sagres e o Burgau e os biótopos intertidais presentes apresentam as características típicas deste tipo de habitat. Ou seja, são principalmente representados por espécies de anelídeos, gastrópodes e bivalves que ocorrem em densidades baixas.

Nas arribas costeiras surgem dois tipos de ambientes geomorfológicos. As superfícies verticais rochosas e as zonas de derrocada.

Nas superfícies verticais rochosas as comunidades do intertidal estão presentes numa estreita faixa não só pelo facto das superfícies serem verticais, mas também porque a faixa de costa entre Sagres e o Burgau permanece relativamente protegida da ondulação e como tal, a área afetada pela aspersão das ondas é muito reduzida. Nestes locais os povoamentos do supratidal geralmente estão ausentes ou tem uma representatividade muito reduzida e o intertidal pode surgir com alguma estratificação.

As biocenoses presentes no intertidal das arribas presentes no troço de costa entre Sagres e o Burgau não apresentam maior predominância de espécies de macroalgas incrustantes ou de espécies de dimensão reduzida. O menor hidrodinamismo permite o estabelecimento de espécies de maior porte e portanto as biocenoses de macroalgas presentes são representadas por uma grande diversidade de específica.

Nas zonas de derrocada, a acumulação de blocos no sopé das arribas cria superfícies heterogéneas que formam ambientes menos alcantilados como um todo. Nestas áreas, as comunidades intertidais têm uma maior área de distribuição, surgem bem estratificadas e reúnem uma grande diversidade de espécies de macroalgas e invertebrados. Nos enclaves surgem inúmeras espécies de moluscos, artrópodes, equinodermes e peixes que não toleram a exposição às condições atmosféricas.

Os recifes rochosos presentes no troço em estudo têm morfologias muito variáveis podendo ser lajes planas que se estendem no leito marinho; blocos rochosos em zonas arenosas, peões ou grandes recifes muito heterogéneos. Nestas estruturas, as comunidades intertidais são modeladas sobretudo pela inclinação e heterogeneidade do substrato pois, o grau de hidrodinamismo e exposição à ondulação não é suficientemente elevado para ter um papel limitante significativo na distribuição das espécies no médio-litoral. Assim, as comunidades intertidais presentes em substrato rochoso no troço em análise não variam muito significativamente.

Relativamente às comunidades intertidais presentes no troço entre o cabo Sardão e Sagres, nas comunidades presentes em substrato rochoso entre Sagres e o Burgau , as biocenoses do supratidal têm uma representatividade muito reduzida devido à natureza pouco consolidada da rocha presente neste troço. O médio-litoral surge estratificado e representado por um maior número de espécies.

Comunidades infratidais

Tal como as comunidades presentes no intertidal, as comunidades presentes no infratidal dependem do tipo de substrato presente.

Nas áreas arenosas as comunidades presentes são geralmente pobres e representadas por poucas espécies cuja densidade depende da presença de fontes exógenas de matéria orgânica e nutrientes. Nas áreas adjacentes às arribas e nos recifes rochosos predominam comunidades mistas que incluem espécies características de ambientes arenosos e rochosos. A riqueza de espécies presentes depende principalmente da heterogeneidade morfológica dos recifes rochosos.

Dada a baixa profundidade média do leito do mar junto às arribas no troço de costa em estudo as comunidades presentes no infratidal apresentam geralmente uma biocenose de macroalgas bem estratificada e representada por espécies de algas verdes, vermelhas e castanhas até profundidades de -10 a -15 m. A partir desta profundidade surge uma biocenose predominantemente composta por invertebrados, nomeadamente, briozoários, anémonas, esponjas, anelídeos sésseis e gorgónias. A ictiofauna é semelhante aos restantes troços analisados anteriormente, com a exceção de que neste troço, tal como entre Sagres e o cabo de S. Vicente, existe maior probabilidade de encontro com grandes espécies pelágicas.

Resta ainda referir que a cerca de uma milha da costa nas proximidades do Martinhal, surge o naufrágio do Torvore a cerca de -30 m. Dada a refração da luz solar, não existem grandes biocenoses de macroalgas na superfície do navio afundado. Contudo, este recife artificial exerce um efeito agregador de inúmeras espécies de peixes apresentando vários cardumes residentes. Este local foi único onde foi amostrado o canário-do-mar (Anthias anthias), que é uma espécie de serranídeo que ocorre preferencialmente em profundidades próximas ou superiores aos -30 m de profundidade.

Pelo referido anteriormente, as principais diferenças presentes nas comunidades existentes no intertidal e infratidal do troço de costa entre Sagres e o Burgau são: a presença de um maior número de espécies sésseis nas cotas de profundidade mais expostas à rebentação das ondas; a maior estratificação das comunidades; e o facto de as comunidades terem características mistas pois a natureza do leito é predominantemente arenosa.